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Ser Sporting não se implora, não se ensina, não se espera, somente se vive... ou não.
Coisas que não se esquecem
Inglaterra, Dezembro de 1987. O tímido Sol londrino tardava em raiar, depois de uma noite em branco na qual as horas desfilavam por entre o diagnóstico de papéis e relatórios. Aquele seria o dia mais importante da minha vida profissional até então – se algo falhasse… bem, não podia falhar mesmo. Felizmente que naquele dia de chuva intensa tudo acabaria por correr bem, não apenas em Londres como também em Lisboa – o Sporting nessa noite derrotava o Benfica por 3-0 em pleno Estádio da Luz, num jogo a contar para o troféu Supertaça. Apraz-me recordar a camisola do Sporting que me acompanhava na mala de viagem (superstição suponho), assim como o telefonema do meu irmão a dar notícia do acontecimento. Paulinho Cascavel, que tinha sido contratado ao Guimarães, marcou um dos referidos tentos. Burkinshaw era o nosso treinador, e João Amado de Freitas o Presidente – injustamente um dos mais “underrated” Presidentes do Sporting. Outros tempos, velhos problemas, outras conversas.
Naquele período, o sistema financeiro em Inglaterra estava num saco de gatos, em contraste com a prosperidade especulativa do início desse ano, um pouco por todo o Mundo – interessante que ao inverso, no Sporting a contenção estava na ordem do dia. As exportações atingiam níveis como nunca, o consumo estava em alta. Em Londres, todo o milionário abria um restaurante de luxo, e até o “jovial” Richard Branson lançava uma marca de preservativos(!). No início do último trimestre porém, uma macro depressão global – com origem no conhecido problema da bolha especulativa que ninguém se preocupou – provocaria o descalabro na Bolsa de Londres (e outras Internacionais), com o mercado de Capitais a entrar num autêntico frenesim. Em consequência, negócios em ruína, preços a cair, com o Governo a impor uma super inflação para suster a crise, sem efeito. Obviamente, um período fértil para as divisas de Oriente e Médio Oriente surgirem. Curiosamente, foi este o início de grandes investimentos na indústria do futebol em terras de Sua-Majestade por parte de investidores não-britânicos. Outras conversas.
Pequenas coisas da vida, simples, que nos marcam
Voltando ao dito dia de Dezembro. Naquela noite, para celebrar (por dois motivos, recorde-se), fui jantar a um dos mais hipster-restaurant do momento, cuja propriedade estava dividida entre o empresário Nigel Martin e um inarrável famoso Chef de cozinha e ferrenho adepto de um clube de Manchester – naquele momento, até os Chef’s de cozinha eram quase milionários. Em virtude do comum interesse pelo desporto-rei, acabei por oferecer ao Chef o referido jersey do Sporting, recebido de modo muito apreciado pelo excêntrico profissional. Ficámos amigos. Uns anos mais tarde (25 mais propriamente), em Manchester, assistimos os dois a uma das maiores efemérides desportivas internacionais do Sporting – o leitor deve lembrar-se qual. Ele trazia a dita camisola vestida, por fair-play à nossa amizade. Um acto que me surpreendeu, que muito apreciei. Uma camisola que me “deu” sorte, uma vez mais. Pequenas coisas da vida.
Coisas do costume
A vida é uma coisa simples, acessível. Sempre desconfiei daqueles que muito teorizam sobre o que sabem, sobre o que alcançaram por mérito próprio, sem que daí consigam explicar o óbvio dos seus infortúnios. Acredito que quem usa e abusa da voz para explicar com cientologia coisas triviais, nada mais deseja do que promover intencionalmente a inércia e apatia de quem escuta. O discurso, baseado no inimigo invisível ou num infame sistema, afim de promover a desresponsabilização por ausência de competência, nada mais serve do que para enganar as pessoas que ficam convencidas, viram costas, acreditando que está tudo bem. E nem sempre está, como se regista nesta época. Para mim, olhando para o quadro geral, uma das mais frustrantes de sempre.
Jorge Jesus e Bruno de Carvalho são os dois, num imaculado conjunto, o maior biscate que poderia ter acontecido ao Sporting. O treinador mais uma vez se revela meretriz de Pinto da Costa e do FC Porto, para geral indiferença de quem já pouco se importa. Um abraço a Casillas e uma palmada a Palhinha é o simbolismo de um frete de quem anda a ganhar milhões e não consegue provar que sabe mais de “bola” do que um Vitor Pereira, Vilas-Boas ou Nuno Espírito Santo. Tem de haver uma explicação simples para isto, tal como para um índice de aproveitamento de 55% no Campeonato – que a alguns pouco preocupa, pois está ainda distante dos 36% de 2013. É disto que o Sporting tem de viver?
E depois, é nas pequenas coisas simples se vê a diferença. André ou Castaignos, como Barcos ou Teo. No convento de Alvalade, qualquer alma perdida tem salvação. Depois, lá surgem os Tiquinhos Soares desta vida. Dono de fisionomia singular de um qualquer mercenário sul-americano, sem pescoço, ombros largos e de olhar assustado sempre que a bola está na mira, a confirmar que o Sporting tem mesmo um fetiche – é o único Clube no mundo que tem sempre duas pré-épocas na mesma temporada. A primeira, recheada de ingredientes e ilusões, serve para entreter a soberba. A segunda, serve sempre para preparar o futuro. Fica uma equipa de retalhos, impreparada, mas cheia de futuro... O problema, é que com o biscate do costume, nem vale a pena falar de futuro, pois o presente é o que se vê.
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