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Ser Sporting não se implora, não se ensina, não se espera, somente se vive... ou não.
O Sporting está em crise indisfarçável. O título começa a ser uma miragem e vamos ver se a caminhada na outra única competição que o clube ainda pode vencer, a Taça de Portugal, não termina já esta terça-feira em Chaves. E quando há uma crise tão evidente começam a procurar-se os culpados. Depois do jogo de sábado, em que o Sporting empatou em Chaves, o presidente foi ao balneário tirar satisfações e, pelos vistos, invectivar os jogadores pelo seu eventual menor empenho. E no domingo terá tido uma conversa alargada com o treinador Jorge Jesus. O problema é que o primeiro responsável de tudo isto é Bruno de Carvalho.
Desde que chegou ao Sporting, Bruno de Carvalho despediu Jesualdo Ferreira, contratou Leonardo Jardim, Marco Silva e Jorge Jesus. Vai no seu quarto treinador e ganhou uma Taça de Portugal. Leonardo Jardim foi campeão na Grécia, lidera atualmente o campeonato francês, com o Mónaco, que é a equipa mais goleadora da Europa. Marco Silva venceu a Taça de Portugal pelo Sporting, foi campeão na Grécia e está agora a recuperar o Hull City, em Inglaterra. Jorge Jesus foi quase campeão na sua primeira época no Sporting, ficando a dois pontos no Benfica, e esta época anunciava-se como de grandes vitórias. Afinal, tem sido de grandes derrotas.
Quais são as ilações do que atrás foi escrito? 1) Bruno de Carvalho sabe escolher bem os treinadores; 2) tem pouca paciência para eles, não lhes dando tempo para consolidar o projeto; 3) apostou as fichas todas em Jorge Jesus na época passada e mais ainda nesta, dando todas as condições ao treinador para fazer melhor que em 2015/16, comprando uma camioneta de jogadores que o técnico pediu para as mais diversas posições.
E que fez Jorge Jesus com tanto jogador? Pois pouco, muito pouco. Em primeiro lugar, desvalorizou os jogadores formados no clube e cedeu-os a outros clubes: Matheus Pereira, Iuri Medeiros, Palhinha, Francisco Geraldes, Ryan Gauld (que o presidente dizia que era o Messi escocês…), etc.
Em segundo, dos jogadores contratados só dois pegaram mesmo: Bas Dost (melhor marcador da Liga) e Campbell, com intermitências. Alan Ruiz ainda tem mais intermitências, Spalvis vai agora para o Belenenses depois de uma longa lesão, Meli quer regressar à Argentina, Douglas é muito grande mas já nos atirou para fora da Taça CTT (embora aquilo não tenha sido penalty nem que a vaca tussa…) e o Markovic foi um grande (L)azar que nos saiu na rifa. Por outras palavras, ou Jorge Jesus é péssimo a escolher jogadores ou há muita gente a ganhar com esta girândola de futebolistas a passarem (e a passearem) por Alvalade.
Em terceiro, dinamitou completamente o lado esquerdo da defesa do Sporting. Aliás, este é um problema que Jesus já tem desde os tempos do Benfica: os defesas esquerdos para ele nunca são suficientemente bons. Na Luz devem ter passado pelo lugar uns 15. No Sporting já vamos em três (Jefferson, Zeegelaar e Bruno César) e com regularidade a imprensa desportiva dá notícia de que Jesus continua incessantemente à procura de novos defesas-esquerdos, não se percebendo porquê. Na sua primeira época, Jefferson foi titular indiscutível, com excelentes prestações. Na segunda foi relegado para o banco e substituído por Zeegelaar, que parecia ser o homem ideal para Jesus. Não era ou já não é. Agora nem para o banco vai.
Bruno César que não é nem nunca foi defesa-esquerdo é o homem do momento. Acontece que é por ali que acontecem muitas das nossas desgraças (o primeiro golo do Chaves vem de um centro daquela zona, o 3-1 co o Rio Ave passou todo por ali). E se está a defender, o Chuta-Chuta não está bastante mais à frente em condições de marcar golos - e lá ficamos nós reduzidos ao Bas Dost. Mas Jesus também conseguiu dar cabo da confiança de outro defesa excepcional: Paulo Oliveira. Encostou-o, só o tira do banco in extremis e lá vem as notícias que está no rol dos dispensáveis.
Ponhamos os pontos nos is. O que vai restar desta fortíssima aposta na época 2016/17 é um grande investimento com um fraquíssimo retorno, sendo de supor que isso possa ter problemas na situação financeira do Sporting. Chega-se, então, ao principal responsável, Bruno de Carvalho, que por acaso enfrenta um processo eleitoral para a presidência do clube. Dificilmente perderá as eleições mas o seu brilho empalideceu manifestamente.
Tentando copiar o estilo Pinto da Costa, abrindo várias frentes de guerra, umas externas outras internas, umas justas outras injustas, umas razoáveis outras completamente irrazoáveis, Bruno de Carvalho está agora fragilizado. Esta última de ir ao balneário depois do jogo de Chaves para aparentemente invectivar os jogadores, que estavam desolados com o resultado, como foi evidente assim que o árbitro deu por terminado o encontro, não ajuda nada a dar confiança à equipa e não melhora o ambiente que se vive entre presidente, treinador e jogadores. E quando se perde a confiança dos jogadores, os resultados dificilmente aparecem.
A sorte de Bruno de Carvalho, por muito que não o queira, está amarrada à de Jesus, com quem fez um contrato multimilionário até 2019. Despedir o treinador custará demasiado ao Sporting. E apesar de todas as manias de Jorge Jesus, o homem sabe da poda. Talvez limitar-lhe as exigências de obrigá-lo a rentabilizar o material humano que tem à sua disposição, fazendo regressar os que estão emprestados e mandando de volta os que não acrescentaram nada, seja uma boa maneira de o colocar à prova. O bom treinador é o que torna bons jogadores apenas regulares, que torna muito bons jogadores bons e que torna excepcionais jogadores muito bons. Jesus já provou que sabe fazer isso. Se não quiser aceitar o repto, que se demita.
Para o seu lugar não faltam boas hipóteses: Rui Jorge, Abel Ferreira (que Bruno de Carvalho despediu da equipa B, substituindo-o por João de Deus – e o Sporting B está à beira da despromoção), Paulo Fonseca. Mas também há Marco Silva – embora esse só venha com outro presidente.
Entretanto, há que cerrar os dentes e ganhar na terça-feira em Chaves. Ganhar não pelo presidente, não pelo treinador. Ganhar pelos melhores adeptos do mundo, ganhar pelo Sporting, ganhar em nome do Sporting. Força, Sporting!
NICOLAU SANTOS, director-adjunto jornal Expresso
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