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Ser Sporting não se implora, não se ensina, não se espera, somente se vive... ou não.
Quando um jogador como o Manoel subia a escadaria de acesso ao relvado no velhinho Estádio de Alvalade e, com os companheiros, corria em direcção ao círculo central para saudar o público presente provocava nos sportinguistas um extraordinário sentimento de entusiasmo e de confiança. Com ele em campo estaríamos sempre mais próximos da baliza adversária e cada um dos adeptos encarava aquele momento primordial do jogo com uma emoção incontida como se tudo se passasse pela primeira vez.
Lembro-bem de Manoel, em Alvalade, na segunda metade da década de 1970. Não era um jogador que vivesse da surpresa, como Manuel Fernandes, da imprevisibilidade, como Keita, ou da magia, como Jordão, apesar de ter jogado com todos na linha atacante do Sporting. Ele era o “bom” companheiro, o “Manoel do ó” ou o “Manoel preto” como era carinhosamente chamado.
É natural que a nossa memória selectiva apenas cristalize os nomes daqueles que se destacaram entre todos. Mas, o que seria o imaginário dos grandes jogos de futebol sem as histórias e os episódios daqueles igualmente grandes jogadores que permitiram que os maiores se evidenciassem?
Manuel Fernandes contou que um dia exclamou para o seu amigo Jordão que “eh, pá ! chegou um gajo com cabedal para levar porrada e distrair os defesas adversários da gente”. O Manel percebeu logo o que se viria a passar: "Ele foi muito importante no sucesso daquele trio comigo, o Jordão e o Keita, porque abria-nos muitos espaços que nós, que éramos tecnicamente mais dotados, aproveitávamos". E o grande capitão conclui que o Manoel “segurava a bola como poucos e era poderoso nos contactos físicos”. Inácio contou uma situação em que chocou com os músculos de uma das coxas de Manoel. Eram duros como mármore. Qual é a equipa que dispensa um jogador assim ?
Manoel veio para substituir o inesquecível Yazalde e isso terá condicionado a impressão colectiva sobre a qualidade do seu futebol. Segundo a Wiki Sporting chegou a Alvalade numa fase de adiantada da época de 1975-76, permanecendo até 1981, e marcou 57 golos em 151 jogos. Nada mau! Estreou-se num Braga-Sporting, em 11 de Abril de 1976.
Foi um jogador vibrante e explosivo, possante e bravo, intenso como hoje se diz, que colocava uma invulgar energia em cada lance que disputava. Ao contrário do que muitos garantiam, não era tosco e quando tinha a bola sabia bem o que fazer com ela. Jogava com facilidade nas alas e aparecia repentino na grande área onde aplicava o seu remate espontâneo e fortíssimo. Punha a cabeça onde muitos não colocavam o pé e auxiliava com frequência o seu meio campo defensivo. Nunca se escondia do jogo.
Os sportinguistas jamais esquecerão aquela tarde de sonho de Março de 1977 quando marcou três golos ao Benfica em Alvalade, num jogo para a Taça de Portugal. No dia seguinte, ManOOOel foi o título do jornal A Bola. Menos conhecido será o lance que disputou com Manaca na pequena área do Guimarães, que pela forma intrépida como se fez à bola levou o então jogador vimaranense a fazer autogolo. Recordo-me, sempre com um sorriso, de um remate violentíssimo que estourou no cimento do peão de Alvalade. Chutou para onde estava virado, mas fiquei a pensar o que seria aquilo nas mãos do guarda-redes. Manoel contribuiu de forma significativa para a conquista de uma Taça de Portugal (1978) e de um Campeonato Nacional (1980).
Recordar é viver
Nota: Este post é dedicado a Manoel, falecido no passado dia dezassete de Outubro. Pretendo homenageá-lo, mas também saudar a alegria da vida e a festa do futebol. E o dérbi de hoje à tarde. O Júlio Coelho, um bom companheiro aqui no Camarote Leonino, defendeu, justamente, a necessidade de se homenagear o atleta e incentivou-me a fazê-lo. Espero ter conseguido corresponder.
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