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Ser Sporting não se implora, não se ensina, não se espera, somente se vive... ou não.
Rogério Casanova, jornal Expresso, analisa com o seu já bem conhecido humor - sem deixar de dizer algumas verdades - a performance dos jogadores do Sporting no jogo de pré-época diante o Marselha:
Cumprido o ritual anual que consite em incinerar um esloveno na fogueira dos seus defeitos, oferecendo-o em humilde sacrifício a Estagius, o Deus das pré-épocas, chegou a altura de utilizar um guarda-redes à altura da história do clube, capaz de defender remates de longe (´4), sair bem fora da área para evitar contra-ataques (´19), e não ter culpas nos golos sofridos (´2 e ´52). De realçar também uma excelente mancha ao minuto 89, talvez a melhor interceção de um lance de perigo feita COM O PEITO por um atleta do Sporting chamado Pedro Silva desde março de 2009.
Imaginemos então que o espelho retrovisor do lado direito da nossa viatura se partiu há uma carrada de anos. Que durante o último ano e meio andámos a prendê-lo ao sítio com fita adesiva, permitindo-nos assim cumprir os mínimos exigíveis em matéria de retrovisão, mas não deixando de ter imensos problemas na manobra, pois a fita adesiva foi comprada no Lidl por oitenta e nove cêntimos, e teima em descolar-se nas alturas mais inoportunas. Imaginemos agora que ao fim deste ano e meio de problemas compramos uma fita adesiva de qualidade obviamente superior, mais resistente, emborrachada, flexível e relativamente impermeável, tipo Flex Tape: uma fita adesiva com melhor aspecto, com maior conhecimento dos princípios gerais da adesividade, capaz de dominar o espelho retrovisor ao primeiro toque, de fornecer apoios, etc. A situação é claramente melhor, mas não deixa de sugerir a pergunta: PORQUE RAIO É QUE NÃO SE GASTOU DINHEIRO E SE COMPROU A PORRA DE UM RETROVISOR NOVO?
Deixou fugir Clinton N'Jie logo a abrir, tornando-se assim a única pessoa do mundo a perder uma corrida contra uma pessoa chamada Clinton nos últimos oito meses. De resto, sem estar mal, comportou-se um pouco como um monarca no exílio, que se vê rodeado de gente nova e sente a soberania transformar-se em clandestinidade de um dia para o outro.
Contratado para substituir o Rúben Semedo de 2016, revelou-se hoje um substituto à altura do Rúben Semedo de 2017: pouco ágil a resistir a momentos de pressão dos avançados, e com tendência para a perda de bola comprometedora, seja em passes aparentemente simples para o lateral (minuto 36), seja depois de incursões abortadas com a bola no pé (como aconteceu perto do intervalo). Ao contrário do que acontece com um ou dois outros reforços, há pelo menos a firme expectativa de que é (e vai voltar a ser) muito melhor do que isto.
Aquele ruído colossal registado ao minuto 17 pelos sismógrafos de todo o mundo? Não há motivo para preocupações: foi apenas o grito colectivo de seiscentos mil adeptos do Sporting e dois milhões e meio de adeptos do Benfica a gritar em simultâneo “aleijou-se, eu já sabia!” quando Coentrão caiu ao relvado agarrado ao joelho. Foi falso alarme. Há que levantar a cabeça e continuar à espera.
Tutelou a construção de jogo e a contenção defensiva a partir de um quadradinho de relva tão formal, limitado e opressivo como uma residência oficial. O combustível extra que a forma física lhe conferiu no primeiro jogo de preparação parece estar a esgotar-se, e a tornar as suas limitações mais visíveis.
Um lance ao minuto 31 demonstrou a utilidade dessa misteriosa característica chamada velocidade de reação: com uma simples recepção orientada no meio e um passe instantâneo para as costas da defesa critou numa fracção de segundos um desequilíbrio temporário em toda a organização defensiva do Marselha (temporário porque a bola chegou pouco depois a Alan Ruiz). Antes disso já tinha permitido o primeiro remate perigoso da equipa, amortecendo a bola para Battaglia. E até à entrada de Podence foi o único a tentar o transporte rápido de bola, mesmo que a definição nem sempre tenha saído bem. Num jogo em que até nem esteve particularmente inspirado, inventou os principais momentos de qualidade da primeira parte.
Como se esperava, e na linha do que mostrou no Braga, mostra uma tremenda utilidade sem bola: esfarrapa-se todo na pressão, farta-se de ganhar ressaltos e até protege bem a posse com o corpo quando a consegue recuperar. Quando tenta construir, especialmente ao recuar para trinco, notam-se as limitações conhecidas (em duas ou três ocasiões em que podia ter variado o flanco com rapidez com um passe mais longo, optou por bolas curtas e seguras aos centrais). Mas tê-lo no plantel continua, até provas em contrário, a parecer boa ideia.
Muito versátil e polivalente a perder sprints quando lançado em profundidade e a fazer faltas imediatas sobre o lateral adversário para evitar contra-ataques. Muito versátil e polivalente a marcar livres indirectos para as mãos do guarda-redes e a recuar logo para manter a forma táctica. Muito versátil e polivalente a perder bolas na meia-lua contrária e a pressionar de imediato. Como toda a sua versatilidade e polivalência é nesta altura como um cinto de castidade táctica, colocado em campo para garantir que ninguém se diverte, sejam colegas, adversários ou espectadores.
Conseguiu fazer o seu número habitual ao minuto 32, recebendo na meia-direita, derivando para o meio e rematando de fora da área, tudo isto em menos de meia-hora. E manteve a sua já mítica abordagem voyeur à pressão alta, optando por não incomodar os adversários e limitando-se a bisbilhotar os seus movimentos a uma distância segura, como se tivesse receio de ser apanhado a espreitar. Continua a ser exasperante que tanto talento consiga ser tantas vezes problema e tão raras vezes solução, a não ser em câmara lenta. Mas é o que temos.
Habituou-nos a finalizar no plural majestático: o golo é dele, mas ele diz que é nosso. É da mais elementar justiça retribuir a gentileza e explicar que hoje tivemos poucas oportunidades, que nem sempre soubemos ligar o jogo com o resto da equipa (fomos melhores na idealização do que na execução), e assumir que na única semi-ocasião que tivemos dentro da área, a bola nos bateu na cabeça em vez de ser a nossa cabeça a bater na bola. Com este, no entanto, não é preciso comprar água potável, conservas e munições: as coisas vão evidentemente regressar ao normal em breve.
Fazendo as contas à distância a que eu me encontrava da televisão e à distância a que a câmara se encontrava da faixa que ocupou, a única coisa que é possível garantir com 100% de certeza é que Jonathan Silva não viu um cartão amarelo, estando por isso de parabéns.
Entrou com a missão de rejeitar a ordem burguesa e perturbar o regular funcionamento das instituições, tarefa que cumpriu com a vivacidade habitual.
Atarefou-se com grande profissionalismo a gerir a correlação de forças no meio-campo: procurando isolar a facção x, neutralizar o opositor y, ou auxiliar o aliado z – não à custa de retórica inspiradora, mas de tacticismos parlamentares, mostrando sempre bom toque de bola, lucidez na distribuição, uma brilhante capacidade para ser inofensivo, e uma comovente esperança em ser útil no plantel actual.
Seria extremamente curioso e extremamente engraçado emprestá-lo a outro clube. Extremamente curioso e extremamente engraçado.
Continua a parecer uma sombra do central que chegou a parecer aos 17 anos, mas reconheça-se que não tem estado mal na pré-temporada.
Aguarda-se com algum frisson a altura em que consiga aliar o andamento para acompanhar as incursões-relâmpago de Podence e Bruno Fernandes com uma sintonia na mesma frequência – perderam-se dois contra-ataques promissores não por falta de pernas ou jeito, mas por terem todos pensado de maneiras diferentes. Marcou (bem) o penálti, e ainda podia ter bisado ao minuto 74, mas foi bem bloqueado pelo ex-futuro colega, Dória.
Mostrou, tal como o já tinha feito várias vezes no final da época anterior, alguma evolução com a bola no pé e uma agressividade e raio de acção a pressionar que poucos têm no plantel.
“... Desprendeu-se a vontade de Francisco Sete-Sóis, mas ao relvado não subiu, pois ao banco pertencia, e à Barafunda”.
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