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Homero é do Sporting.

Drake Wilson, em 21.06.18

 

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Peca quem apressa o Hóspede que não quer partir,

como quem o detém quando este já está a partir.

O Hóspede deverá ser bem tratado se ficar,

e não deverá ser impedido de partir se assim o desejar.

 

por Homero, o culpado.

 

Por vezes, questiono-me que entidade sobrenatural terá o Sporting perturbado ao longo da sua centenária odisseia, que tão reiteradamente condene este Clube a crises, convulsões e outras metafóricas maldições tão frequentes. Na nossa elementar sinceridade, é inquestionavelmente um grande Clube, mas persistentemente condenado a um palco institucional patético. Por vezes, o Sporting consegue ser uma corporação demasiado complexa para o talento humano… seja qual for o talento. Essa complexidade, prende-se não com as diferenças entre a “eleita” e a “putativa”, mas com a própria natureza do Clube.

 

O Sporting é o quê?

 

Comecemos pelos tais 3,5 Milhões de Adeptos que o Sporting tem. Podiam ser 6 Milhões, mas na origem procurou-se um caminho distinto, que invariavelmente fez do Sporting o que o Sporting é. A formação Social e Desportiva, o Ecletismo, as conquistas nas Modalidades, Moniz Pereira, Aurélio Pereira, 5 Violinos, são alguns símbolos da génese do Sporting que não sucederiam, pela doutrina, se o Sporting seguisse o caminho popular dos 6 Milhões. Este Sporting, envolto numa concepção de elite, (e não de elites), perdeu porém, a partir da década de 70 o comboio competitivo na sua principal modalidade, o Futebol. Nada de novo, portanto.

 

Dentro deste universo de 3,5 Milhões de Adeptos do Sporting, existem partidários de uma espécie de doutrina reformista, embrionada num emergente burguesismo sem conteúdo, que surgiu na Lisboa pós-revolução. Essencialmente novos-ricos, filhos de famílias influentes ou até operários órfãos de representatividade social, estes multiplicaram-se com ideologias revolucionarias sem substância ou aplicabilidade na vida social ou profissional. Introduziram-se no Sporting como puderam, ou conforme o grau académico ou influência lhes permitiu, e difundiram dentro do Clube as suas frustrações, a sua instabilidade pessoal, em formato de militância. Começou com os negócios de Jorge Gonçalves e com a problemática empregabilidade dos filhos de João Rocha, fundadores de uma claque – os primeiros a tentarem convergir o Sporting em ideais pessoais. Aqui, encontramos o ponto onde o Sporting começa a mudar, para pior.

 

Supõem-se tratarem-se de sportinguistas, pois muitos são Sócios e acompanham frequentemente o Clube. Mas involuntariamente odeiam o Sporting e a sua genética leonina. Foram os primeiros a confundir o Sporting que existia – que não lhes servia – com o Sporting que desejariam ter, mas não tinham. Para disfarçarem a falta de intelectualidade, lançaram a primeira golpada no Sporting – confundir os princípios de elite (e não elitista) de um Clube, como causa ao seu insucesso. O Sporting "não ganhava no Futebol pela ala financeira”, foi um termo usado por demasia já na década de 80. Estes actores, Gonçalves e referidos refractários, trouxeram problemas de contabilidade, e pior, abriram o Sporting a aproximações políticas. Gonçalves com o PSD na ocasião, Juventude Leonina com a extrema-direita. Fiquemos por aqui em relação a este tema, por ora.

 

Quem tomou realmente o Clube de assalto?

 

Estes, e aqueles que descendem dos seus exemplos revolucionários sem causa, valorizam o Sporting como “Clube diferente”, mas odeiam o Clube por não ter 6 Milhões de Adeptos. Vangloriam-se da importância das nossas Modalidades, apenas como contrapeso à cólera que lhes desperta a ausência de títulos na principal, o Futebol. Estes Adeptos, como representação do clientelismo que tomou progressivamente o Clube de assalto desde os referidos exemplos, utilizam o Sporting como ascendente a particulares interesses sociais, profissionais, e até mesmo políticos. O Sporting, como o próprio é, não lhes interessa. O que lhes interessa, é ter uma fórmula para ganhar no Futebol e, por conseguinte, obterem representatividade para futuras aventuras.

 

Como referi, alguns alcançaram as claques, como as conhecidas militâncias de extrema-direita que posteriormente provocaram cisões dentro da Juventude Leonina e geraram novos grupos de apoio… ao Sporting / interesses políticos? Outros, como Presidentes, alcançaram o voto popular com a premissa de romper com o passado, mas curiosamente nenhum deles constituiu melhores bases para o futuro. Do Sporting servem-se, lá está, como clientes, onde desejam viver uma série de experiências que lhes permitam descobrir e usar os seus talentos, aprender, e posteriormente engajarem-se na vida. O que procurou Sousa Cintra? O que procurou Luís Duque? O que procurou Santana Lopes? O que procura Mário Machado? E finalmente, o que procura Bruno de Carvalho? Estes vivem somente, de recrutamento alheio, como trampolim. Um antagonismo ao circo institucional do Sporting? Naturalmente que não, porque o Circo só não o vê quem não quer.

 

A emulação de um falhado

 

Bruno de Carvalho é, no meu entender, uma das maiores fraudes que surgiu no Sporting. Num artigo publicado a 30 de Abril deste ano no Diário de Notícias, intitulado “A verdade sobre a situação financeira do Sporting”, porventura redigido em parceria com Nuno Saraiva e que só recentemente o li, são abordadas questões de natureza financeira, uma espécie de Magnum Opus sofista. Numa linguagem intangível e abstrata, confunde matérias nunca relacionáveis – renegociação da dívida bancária com aumentos de posição accionista (desculpe??) –, responsabilizando o reequilibro da situação financeira pelo crescendo do sucesso desportivo (nas Modalidades, suponho?), não esquecendo a pérola “crescimento sustentado de todas as linhas de receitas comerciais…” – “crescimento sustentado de receitas” é algo que nunca calculei existir. Trata-se possivelmente do “grito do ipiranga” da Economia de Marx, uma mudança total de “paradigma”, ou simplesmente pavor em morrer afogado em dinheiro. Deu-me, por alguns segundos, vontade de rir.

 

Se o referido artigo teve Bruno de Carvalho como autor, Carlos Vieira é um péssimo professor. A demissão automática do segundo seria tão óbvia como a falta de cultura do primeiro.

 

Depois, as aparições televisivas. A benevolência que Bruno de Carvalho crê como serviço público, através de um discurso somente estéril e incorpóreo, revela-se, perante toda a sociedade como um degradante préstimo intelectual. Quando acordamos, percebemos que já não nos lembramos da pergunta nem percebemos a resposta, qual retórica golpada de quem não tem solução para os problemas criados por si. Bruno de Carvalho destruiu o seu próprio projecto desportivo, desmembrou a equipa de Futebol, transformou o Sporting num conflito à sua imagem – no fundo, a maior face do clientelismo onde os interesses particulares são sempre superiores aos interesses do Clube. O Sporting pós 25 de Abril quase sempre existiu como veículo de interesses de Presidentes, sendo a presidência de Bruno de Carvalho a que mais suspeitas levanta. Que currículo tinham Gonçalves, Sintra, Santana e Carvalho (alguns exemplos) para ocuparem a Cadeira no Sporting? Eram todos clientes profissionais! Por vezes, os Adeptos mereciam uma providência cautelar.

 

Mas por um lado, agradeço a Bruno de Carvalho a lição que nos deu a todos. Demonstrou que no Sporting existem dois Clubes, duas facções, duas vertentes de pensamento, que como em quaisquer nações ideologicamente distintas, dia algum se conciliarão. Ele simplesmente escolheu o seu lado, como qualquer cliente escolhe o fruto do seu prazer. Muda de Treinador como quem muda de telemóvel. Cria grupos privados de Whatsup para se unir aos Atletas e publicações públicas de Facebook para os destruir. Permite a convivência de grupos de destabilizadores com Jogadores da qual resulta o maior êxodo desportivo alguma vez visto em Portugal. Promove um sucesso económico encoberto até a CMVM proibir um simples empréstimo obrigacionista que põe a descoberto a falta de liquidez, levando a PWC a assumir perante o órgão regulador a ameaça da continuidade da operacionalidade do nosso Clube. Tudo isto é criminoso. Para mim é o resultado óbvio do que sucede quando o Cliente... se torna Presidente. 

 

Mais do que nojo, tenho pena daquilo no qual o Sporting se tornou.

 

publicado às 11:00

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51 comentários

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De Drake Wilson a 21.06.2018 às 13:40

O Hugo levanta uma questão interessante.

De facto, o pensamento como militância social foi-se perdendo ao longo dos anos, esvaziando-se em conteúdo de modo progressivo. Hoje não há lideres, existem somente paradoxos frustrados de desempregados em palestras – o coaching.

Se observarmos a aniquilação progressiva dos conteúdos programáticos da televisão portuguesa na década de 60, 70 e 80, com uma vertente muito mais pedagógica e educativa, percebemos o reflexo dessa mudança.

Sistema de ensino mercantilizado, professores-formadores ridicularizados por alunos, numa teoria do caos que culmina com a aceitação do grotesco como marca social. Os rebeldes sociais sem causa tomaram conta do prime-time. Depois, o laissez faire do "Club Med" político fez o resto.

Como já não existem arenas romanas, sobra o Futebol como escape.
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De hugo gomes a 21.06.2018 às 16:49

Para mim o que estamos a passar é o fim do período de nojo,de uma era de ditadura e tenho esperança que a sociedade por um lado começa a mudar e a tentar limpar a coisa é também as gerações mais novas que muito pouco contacto humano tem e a razão das claques e de gente tão frustrada.

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