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Sonho de cada vez que há um jogador assim em Alvalade. Manuel Fernandes parecia que jogava a um ritmo superior ao que os seus pulmões e músculos permitiam e transmitia-nos aquilo que é intrínseco ao futebol: a ilusão. A ilusão de que com ele a vitória seria sempre possível, de que havia alguém que determinava o jogo, que não receava ter a bola e correr com ela em direcção à baliza adversária.

 

Quando com o seu olhar de coragem e de orgulho galgava metros e metros do relvado ou veloz se esgueirava dentro da grande área por entre os defesas adversários, eu suspendia a respiração.  Quando chegava o momento de alvejar a baliza, o meu coração batia mais depressa. Ou, emoção!, quando de súbito a bola cruzada morria-lhe no peito e ele, o Manel, parava num movimento por nós já conhecido… e, num improviso, disparava a esfera feita fera. Golo !

 

Há quem recuse colocar o grande futebol ao nível da grande literatura. Pois, eu sempre considerei que o Manuel Fernandes escrevia poesia no relvado através dos seus movimentos felinos característicos ou no imprevisto de um remate certeiro. O poeta José do Carmo Francisco dedicou-lhe um sentido poema.

 

Segundo poema para Manuel Fernandes (1986):

 

 

Não lhe podem tirar tudo

mas escondem-lhe o nome, os golos,

as vozes de quem, nas humildes casas

lhe grita o nome à volta do som dum rádio

nas tardes interrompidas de um quotidiano igual.

Não são homens - são sombras - escondem o rosto,

furtivos, fechados nos gabinetes, nos automóveis,

roubam os sonhos, decretam a morte civil

dum jogador assim perseguido sem porquê.

Não lhe podem já tirar tudo,

ao menos ficam os troféus oficiais, as recordações

as homenagens mais particulares

as fotografias dos jornais e os abraços

dos companheiros a correr do outro lado do campo.

Não são homens - são sinais de um castigo

que se perde no fundo do tempo, longe,

lá onde começou a primeira de todas as guerras,

lá onde tábuas de morte se pregaram no coração.

 

 

P.S.: O “capitão” Manuel Fernandes envergou a camisola leonina de 1975 a 1987. Venceu o Campeonato Nacional e Taça de Portugal por duas vezes, tendo conquistado uma Supertaça e uma Taça de Honra. Em 1979 foi-lhe atribuído o Prémio Stromp na categoria “Atleta Profissional”.

 

José do Carmo Francisco dedicou o poema a Manuel Fernandes por não ter sido seleccionado para o Campeonato do Mundo de 1986, no México, apesar da época extraordinária que realizou, tendo conquistado a Bola de Prata com 30 golos em 29 jogos.

 

A caricatura do Manel é da autoria do saudoso Francisco Zambujal, meu professor na Escola Primária de S. Luís, em Faro.

 

publicado às 11:04

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8 comentários

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De Jùlio a 01.05.2015 às 13:12

Numa equipa de futebol há o capitão e a seguir vem o avançado. Podemos ter um grande central ou guarda redes, mas o avançado é o marca a maior parte dos golos e faz levantar os adeptos das cadeiras para festejar. O Grande Manel reunia essas duas condições, a que juntava e junta, o seu amor ao clube. Numa época em que vão faltando as referencias era preciso que o exemplo do Manel estivesse mais próximo do dia a dia do SCP.
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De Leão Zargo a 01.05.2015 às 13:40

Júlio

Belas e justas palavras!

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