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Ser Sporting não se implora, não se ensina, não se espera, somente se vive... ou não.
Bolas no poste. Tácticas erradas. Lances polémicos. Aquisições falhadas. Dinâmicas de jogo inadequadas. Balanços e balancetes. Coisas do pontapé na bola. Coisas do nosso dia a dia que movem multidões e acicatam discussões.
Mas hoje vou em contracliclo,contrariando a natureza do espaço.Vou concluir a minha participação, neste ano, que se despede, com uma história, que como todas as histórias, tem alguma coisa de realidade. Mas semelhanças com a realidade podem ser, ou não, mera ficção.Que me perdôe a Administração por este desvio ao padrão. Apelo ao seu espírito natalício.
Esta é a história de uma nau e do seu timoneiro, um timoneiro sem experiência de navegação, mas que quis navegar, por mares que nunca tinha navegado. Do que se sabe ,apenas pilotou uns barquitos que navegavam no mar da palha e que já estão todos em doca seca.
Quando conseguiu ocupar e dirigir a grande nau, sem experiência, sem conhecimento das regras náuticas, sem conhecimento da navegação astronómica, decidiu navegar à vista. Sem projecto, sem rumo definido, foi navegando, umas vezes empurrado por ventos favoráveis, outras à bolina,e sempre com terra à vista. A sua tripulação era nova mas generosa. Os seus pilotos jovens mas ambiciosos. Etapa a etapa, em segurança, foram levando a nau, rumo à conquista do almejado ouro. Contudo, este ainda não brilhava no horizonte. Mas com teimosia e agarra a tripulação conseguiu adquirir alguma prata e aumentar a esperança de chegar às prometidas “Índias”.
Eis senão quando, numa reviravolta dramática, o timoneiro, se virou contra a sua tripulação, atirou borda fora o seu piloto, numa manobra de ingratidão, perante os relevantes serviços prestados, e contratou outro piloto. O novo velho piloto, homem de muita "prestança", que navegava por outros mares ao serviço de “Castela”, aceitou dirigir a nau a troco de muita prata e bom proveito. O timoneiro deu-lhe o pouco que tinha e o muito que não tinha, nem sabia se viria a ter. Refez a tripulação a seu bel-prazer e partiu com altivez gritando aos quatro ventos. Índia já. Ouro, pimenta e tudo o que houver. Agora, como há quinhentos anos. Tudo leva a crer que pouco sabe de história, porque há quinhentos anos esse objectivo foi fruto de muito labor, paciência, rigor, secretismo, planificação bem pormenorizada e melhor executada.
O timoneiro e o seu piloto, também pouco conhecedor da navegação com instrumentos náuticos, continuaram a navegar à vista. Mais, ignoraram que os mares estão cheios de obstáculos e são de per si indomáveis. Há ventos traiçoeiros, tempestades inesperadas, que até os mais bem preparados têm dificuldade em enfrentar. A viagem começou a correr mal. Nem ouro, nem pimenta, nem nada. O timoneiro não aguentou a pressão. Perdeu o norte. Gritou a todos os ventos que a culpa era dos adamastores. Desembainhou a espada e da proa à popa atacou em todas as direcções: contra os adamastores do passado que lhe entregaram uma nau em mau estado e mereciam o degredo, contra as regras marítimas que lhe tolhiam a navegação, contra “Castelas “ , sobretudo contra “Castela” por existir e lhe disputar as conquistas. Lutas e mais lutas. Todas perdidas.Todas naufragadas.
Um fogo de santelmo tirou-lhe a pouca lucidez. Furioso, alucinado, por não dominar os elementos, o timoneiro subiu ao mastro, despiu as vestes, colocou-se na gávea e enjoado vomitou impropérios, enfrentou todos os adamastores e com a sua voz cavernosa declarou : eu não vos receio, porque sou o maior nas navegações; nunca erro nem nunca errei; vou vencer-vos, abutres, ratos de porão e mais bicharada. Venham todos. Sejam quantos forem. Os adamastores na sua rigidez de pedra, não o ouviram, nem lhe responderam. Surdos e mudos ignoraram. De tanto gritar ficou a falar sozinho, perdido no labirinto em que se meteu. Apenas as sereias o ouviam e aplaudiam, e nas suas melopeias clamavam: "salvé ó grande mestre e salvador, sem ti nem o sol se move.”
Entretanto a nau continua a navegar, cada vez mais longe das “Indias”. Já nem navega à vista. Anda à deriva. O novo velho piloto meteu-se no mar alto e está perdido. A tripulação está desorientada e descrente. Pobre nau. Os piratas do mares seguem-na a curta distância. Querem os despojos. Os homens do” tráffico” aguardam a sua oportunidade. O timoneiro agarra-se ao poder como uma lapa. Mesmo que a nau soçobre, teima em navegar.
Que cada qual tire desta espécie de parábola os ensinamentos que entender, sejam quais forem, e que tenham um bom Natal, como símbolo de renascimento.
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