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Ser Sporting não se implora, não se ensina, não se espera, somente se vive... ou não.
Rui Pinto terá assegurado um lugar na história do futebol profissional português. Não pelo método, obviamente ilegal, mas porque os muitos documentos que alegadamente obteve e difundiu provocaram um terramoto judicial de dimensões inéditas e consequências ainda difíceis de prever.
O 'hacker' português pode até ser movido pelo desejo de expor os "podres" do futebol, como chegou a dizer, mas é evidente que o fazia por dinheiro. Sendo o modo e a conduta condenável, Rui Pinto não teria a atenção que está a ter caso não houvesse matéria nos servidores dos clubes que aponta para actos de gestão questionáveis e a intenção de adulterar a verdade desportiva, em particular no caso do Benfica.
O quadro pintado pelos vários casos em curso de justiça do futebol português é o de uma competição onde existe um sistema de condicionamento dos seus agentes e uma luta permanente pelo domínio desse sistema. Há um jogo de bastidores a que se dedica tanta energia como à competição dentro das quatro linhas.
Energia e recursos, humanos e financeiros. Era assim no tempo do Apito Dourado e do Apito Final e é assim agora, ainda que com novos intervenientes. São árbitros, agentes da liga e até judiciais, numa imensa teia de influência.
A forma como o FC Porto e Franscico J. Marques aproveitaram os emails, pagos ou não pagos, obedece à mesma lógica. Mais do que remeter elementos para a justiça e deixá-la fazer o seu papel, os emails serviram para tentar conseguir vantagem fora do campo. Não foi uma limpeza, só mais sujeira.
As suspeitas do E-Toupeira são o grau zero, ao somarem a tudo o resto a violação do sistema judicial. É uma enorme ironia que um esquema que permitia o acesso electrónico a processos usando 'passwords' roubadas tenha sido descoberto em mensagens de correio electrónico roubadas por um 'hacker'. Quem com ferro mata…
Luís Filipe Vieira pode lavar as mãos, até porque não é arguido neste caso, mas ninguém acredita que não soubesse ou ordenasse. A saída de Paulo Gonçalves não o iliba. Qual a conduta mais condenável, a do pirata ou a do presidente?
Numa altura em que se discute a recondução de Joana Marques Vidal, o trabalho do Ministério Público nesta matéria é mais um elemento que concorre para a sua manutenção no cargo, que felizmente vai parecendo cada vez mais certa. Tal como noutros domínios, há outra esperança no fim da impunidade.
Mas ela é muito ténue. Enquanto nós adeptos continuarmos a encher estádios e audiências televisivas com total indiferença em relação ao comportamento ético dos líderes dos clubes, dificilmente teremos mudanças de fundo.
André Veríssimo, director jornal Negócios
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