Saltar para: Post [1], Comentários [2], Pesquisa e Arquivos [3]




thumbnail_97146514.jpg

Aquela velha noção dos ingleses que o futebol é a coisa mais importante, das coisas menos importantes, ainda tem razão de ser? No meio de uma pandemia onde morrem pessoas, consegue o futebol ser o regresso semanal à infância, e um espaço de liberdade único onde somos selvagens e sentimentais, de que falava Javier Marias?

Escrevo isto com muita preocupação, e sim, pessimismo e desencanto, parece-me que o futebol vai entrar numa crise muito profunda com o que se está a passar. Parece-me que há pessoas que estão de algum modo como os passageiros do Titanic, à beira do naufrágio, mas não prescindindo do quarteto de cordas para entreter...

Olho para a foto do post, do futebol de antigamente da minha infância, e redobro a minha determinação de ser veemente contra o regresso, sobretudo por se perceber que o mesmo é precipitado por uma indústria corrupta que criou um monstro incontrolável, à margem de todas as noções de legalidade, e sobretudo da mínima decência.

Tudo o que estamos a viver é novo, volátil, inexplicável e sobretudo imprevisível. Ninguém vai sair exactamente igual do momento que vivemos, a concepção sobre o que é a vida vai necessariamente mudar, e isto que se está a passar no Mundo é demasiado avassalador para as pessoas se distraírem por duas horas com pão e circo, metendo em risco a vida e a saúde dos profissionais da modalidade, que são tratados como os gladiadores na Roma antiga. A lógica? São bem pagos, têm mais é que comer e calar, porque há uns abutres que precisam de aproveitar este momento para atenuar as perdas da crise...

No futebol puro do tempo do senhor Rui Manuel Trindade Jordão isto não existia, porque a televisão era um fenómeno residual, quando hoje faz simplesmente parte da indústria global do entretenimento. Questiono-me... se alguém consegue sentir o mesmo prazer, paixão e alegria com o futebol no contexto em que estamos.

Penso para trás, e penso no que era a grande falta de racionalidade da minha vida. Até há dois meses, eu era louco por bola, adorava futebol, era capaz de ver uns vinte jogos por semana, sem exagero, senão vejamos:

Via os jogos todos do Sporting, do Benfica, do Porto, às vezes os jogos do Braga...! Via os jogos do Atlético de Madrid, do Real Madrid, do Barcelona, do Liverpool, do United, do City, da Juventus, às vezes os jogos do Inter assim com os do Bayern e do Dortmund... À terça escolhia um jogo da Champions, à quarta escolhia outro, à quinta via o nosso Sporting na Liga Europa...! Quando era época de selecções para além do jogo de Portugal, via sempre mais um ou dois jogos.

Estamos a entrar no terceiro mês consecutivo sem bola, e sinto que isto só nos faz bem; permite uma pausa na vertigem semanal e faculta racionalizar a realidade. Era absurda a vertigem em que estávamos, onde o futebol fazia parte do entretenimento nocturno diário da vida dos adeptos.

Ah... e quando não eram os jogos de futebol, eram os sempre intermináveis programas a falar sobre os jogos. Eram os dias seguintes, os prolongamentos, e o diabo a sete.

Isto era um mundo digno de uma peça de Ionesco, e pessoalmente esta pandemia fez-me concluir que gastava muitíssimo mal o meu tempo. Mas sobretudo ficar com a certeza que vou passar a ter uma relação muito mais racional com o futebol.

Por todas estas razões sou vincadamente contra o regresso do futebol nesta altura. Não vejo a menor necessidade neste cenário, e pior creio que vai contribuir para o afastamento dos adeptos. Mas enfim, um futebol que acha uma nova normalidade nos jogos à porta fechada, não quer saber dos adeptos para rigorosamente nada. Se os adeptos reagirem e virarem as costas ao futebol, ninguém pode estranhar.

Texto da autoria de Pedro Soares (Originalmente publicado num Grupo de Facebook), a quem agradecemos desde já a gentileza.

publicado às 04:04

Comentar

Para comentar, o leitor necessita de se identificar através do seu nome ou de um pseudónimo.


14 comentários

Sem imagem de perfil

De Schmeichel a 14.05.2020 às 09:34

Não me parece que realizar jogos sem espectadores possa criar algum tipo de risco acrescido…. e como é obvio as sociedades têm de se entreter e o futebol sendo o desporto rei tem um papel muito importante na sociedade portuguesa.

Queria apenas acrescentar um ponto….. na minha forma de ver a gestão do futebol tem de mudar…. os custos antes do Covid na gestão de um clube de futebol eram exagerados e fora da realidade, pagar 10% de comissões a agentes que não contribuem para o futebol, pagar valores exorbitantes por treinadores e jogadores não pode continuar.
Os orçamentos dos clubes têm vindo todos os anos a subir sem isso se refletir num aumento de qualidade, o que aumentou foi apenas a mama e aumentou a dependência de empresários e fundos de investimento para coim isso manter a rolar a máquina das compras e vendas de jogadores por valores obscenos e com isso manter a máquina das comissões a trabalhar.
Não tem sentido apostarmos num puto da formação e passado 1 mês já o estamos a vender…. e depois vamos comprar um estrangeiro qualquer…. fazendo as contas o lucro é irrisório e o que fica é que deixamos de ser um clube de futebol para ser uma empresa de futebol….. coisas muito diferentes e que esta crise vai ter o condão de trazer o futebol para uma gestão mais humilde mas mais condizente com a realidade das receitas.
Imagem de perfil

De Rui Gomes a 14.05.2020 às 13:12

Compreende-se o argumento, ou pelo menos o desejo, mas eu acredito veemente que com a crise ultrapassada, partindo d princípio que o vamos conseguir, tudo eventualmente voltará à "normalidade".

Não devemos subestimar a ganância do homem...

Comentar post





Subscrever por e-mail

A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.

Taça das Taças 1963-64



Pesquisar

  Pesquisar no Blog



Arquivo

  1. 2024
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  14. 2023
  15. J
  16. F
  17. M
  18. A
  19. M
  20. J
  21. J
  22. A
  23. S
  24. O
  25. N
  26. D
  27. 2022
  28. J
  29. F
  30. M
  31. A
  32. M
  33. J
  34. J
  35. A
  36. S
  37. O
  38. N
  39. D
  40. 2021
  41. J
  42. F
  43. M
  44. A
  45. M
  46. J
  47. J
  48. A
  49. S
  50. O
  51. N
  52. D
  53. 2020
  54. J
  55. F
  56. M
  57. A
  58. M
  59. J
  60. J
  61. A
  62. S
  63. O
  64. N
  65. D
  66. 2019
  67. J
  68. F
  69. M
  70. A
  71. M
  72. J
  73. J
  74. A
  75. S
  76. O
  77. N
  78. D
  79. 2018
  80. J
  81. F
  82. M
  83. A
  84. M
  85. J
  86. J
  87. A
  88. S
  89. O
  90. N
  91. D
  92. 2017
  93. J
  94. F
  95. M
  96. A
  97. M
  98. J
  99. J
  100. A
  101. S
  102. O
  103. N
  104. D
  105. 2016
  106. J
  107. F
  108. M
  109. A
  110. M
  111. J
  112. J
  113. A
  114. S
  115. O
  116. N
  117. D
  118. 2015
  119. J
  120. F
  121. M
  122. A
  123. M
  124. J
  125. J
  126. A
  127. S
  128. O
  129. N
  130. D
  131. 2014
  132. J
  133. F
  134. M
  135. A
  136. M
  137. J
  138. J
  139. A
  140. S
  141. O
  142. N
  143. D
  144. 2013
  145. J
  146. F
  147. M
  148. A
  149. M
  150. J
  151. J
  152. A
  153. S
  154. O
  155. N
  156. D
  157. 2012
  158. J
  159. F
  160. M
  161. A
  162. M
  163. J
  164. J
  165. A
  166. S
  167. O
  168. N
  169. D




Cristiano Ronaldo