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Ser Sporting não se implora, não se ensina, não se espera, somente se vive... ou não.
Sándor Peics ingressou no Sporting na temporada de 1949-50, herdando de Cândido de Oliveira uma equipa campeã nacional, mas sem Peyroteo que abandonou o futebol no início da época. O treinador húngaro utilizava um sistema táctico muito em voga naquela altura, conhecido por WM, onde o avançado-centro estava sujeito a uma marcação cerrada pelo defesa central.
Considerando a importância do avançado-centro, o seu maior desafio foi encontrar um substituto para Peyroteo, e começou por experimentar Rola (substituiu o “Bombardeiro” no jogo de despedida) e Mário Wilson que possuíam o perfil clássico do nº 9: muito fortes fisicamente e com um remate fácil e potente. No entanto, Peics pretendia para o lugar um jogador tecnicista e versátil que confundisse as marcações duras e impiedosas.
Jesus Correia era uma dor de cabeça para os defesas adversários. Com uma velocidade e técnica estonteantes, uma imaginação constante, um remate forte e colocado e um invulgar instinto para o golo, jogava normalmente na posição de extremo-direito. Peics deslocou-o para o eixo do ataque na fase final do Campeonato Nacional, tendo participado em quatro jogos (Benfica, Académica, O Elvas e Vitória de Guimarães).
Nesses jogos, Jesus Correia correspondeu às expectativas do seu treinador, marcou 9 golos e os leões venceram sempre. Randolph Galloway, na época seguinte, voltou a utilizá-lo como avançado-centro, mas seria João Martins a afirmar-se nessa posição. “Necas” voltou ao lugar de extremo direito, mas os 159 golos que marcou em 208 jogos oficiais revelam bem a sua veia goleadora.
Na fotografia, a equipa do Sporting que defrontou o Vitória de Guimarães no Estádio do Lumiar em 7 de Maio de 1950. Jesus Correia jogou a avançado-centro.
Em cima - Manuel Marques (enfermeiro-massagista), Octávio Barrosa, Manuel Passos, Juca, Veríssimo, Sándor Peics (treinador), Canário, Fernando Vaz (adjunto) e Azevedo;
Em baixo - João Martins, Vasques, Jesus Correia, Travassos e Albano.
Velhos conhecidos…
O Sporting e o Atlético de Madrid (ou Athletic Aviación como se chamou entre 1939 e 1947) são velhos conhecidos. Reencontram-se agora numa eliminatória da Liga Europa, mas os embates entre os dois clubes remontam à década de 1940 quando se defrontaram em cinco jogos amigáveis. A partida de maior destaque aconteceu na inauguração oficial do “novo” Estádio Metropolitano, em 12 de Outubro de 1944, que tinha ficado destruído durante a cruel Guerra Civil espanhola. Os ‘colchoneros’ venceram por 3-1.
No entanto, o jogo que os sportinguistas recordam sempre com um sorriso nos lábios é o da vitória em Madrid por 6-3, em 5 de Setembro de 1948, tendo Jesus Correia marcado os seis golos. Os ‘colchoneros’ não perdiam no seu estádio há ano e meio, e a qualidade e eficácia do futebol da equipa leonina impressionaram imenso a imprensa espanhola. Foi muito referido o estranho posicionamento de Peyroteo fora da grande área, obrigando o defesa Tinte a segui-lo, o que possibilitou as incursões rápidas dos avançados do Sporting.
Em 8 de Setembro, o jornalista Ramon Melcon justificou a vitória verde e branca da seguinte maneira na revista Stadium: “Quando uma equipa faz um jogo de perfeito enlace entre todas as suas linhas e entre os homens de cada uma delas, quando todos os seus jogadores dão provas de possuir uma excelente preparação física e um sistema de jogo de estreita marcação, além de serem mais rápidos e ágeis do que os seus adversários, não é de estranhar que consigam impor-se a estes.”
O jornalista revelou-se fascinado com os “cinco violinos”, mas Jesus Correia foi o homem do jogo. Essa partida no Metropolitano é histórica porque, para além do “Necas”, não há outro jogador que tenha marcado seis golos num jogo ao Atlético de Madrid no antigo Metropolitano, depois no Vicente Calderón ou agora no novíssimo Wanda Metropolitano. Em homenagem a Jesus Correia existe uma placa comemorativa desse feito no actual Metropolitano, como houve nos dois estádios anteriores. E as botas que ele utilizou nesse dia mágico podem ser vistas no Museu Sporting.
Ficha de jogo:
Jogo amigável
Atlético de Madrid 3 - Sporting 6
Estádio Metropolitano (Madrid), 5 de Setembro de 1948
Atlético de Madrid: Domingo, Riera (cap.), Tinte, Mencias, Farias, Valdivieso, Juncosa, Vidal, Escudero, Torres e Basabe
Treinador: Emilio Vidal
Golos: Escudero (73m e 73m) e Vidal (89m)
Sporting: Dores, Passos (Moreira, 46), Manecas (cap.), Juvenal, Canário, Veríssimo, Jesus Correia, Vasques, Peyroteo, Travassos (João Martins, 46) e Albano
Treinador: Cândido de Oliveira
Golos: Jesus Correia (9m, 20m, 32m, 34m, 49, e 67m)
Na fotografia, a equipa do Sporting que iniciou a 2ª parte:
Em cima - Canário, Manecas, Moreira, Veríssimo, Juvenal e Dores;
Em baixo - Jesus Correia, Vasques, Peyroteo, João Martins e Albano.
Seis golos em Madrid
Jesus Correia, o ‘Necas’, era uma dor de cabeça para os defesas adversários. Com uma velocidade e técnica estonteantes, uma imaginação constante, um remate forte e colocado e um invulgar instinto para o golo, jogando na posição de extremo-direito conseguiu revelar toda a sua capacidade ofensiva nos míticos ‘Cinco Violinos’. Esta linha avançada constituída por Jesus Correia, Vasques, Peyroteo, Travassos e Albano, num misto de força e de técnica, de energia e de habilidade, improvisava verdadeiros recitais nos campos de futebol. Música clássica ou vanguardista, sempre de acordo com as circunstâncias do jogo.
Uma das tardes de glória de Jesus Correia aconteceu no dia 5 de Setembro de 1948, no Estádio Metropolitano, em Madrid, frente ao Atlético. Aos 67 minutos o Sporting vencia por 6-0, com seis golos do ‘Necas’. Até ao final do jogo os madrilenos marcaram três vezes e amenizaram a dura derrota. No dia seguinte, o jornal ‘El Mundo Deportivo’ escreveu que “os homens do Sporting dominam com perfeição a escola moderna concebida na marcação e na desmarcação, trocando de posições continuamente de maneira a desconcertar os adversários, sobretudo Jesus Correia, o magnífico extremo-direito”.
António Jesus Correia
3 Abril 1924 - 30 Novembro 2003
Um dos imortais "Cinco Violinos"
Este livro de José do Carmo Francisco já foi publicado há uns bons anos, mas permanece em mim o gosto de voltar a pegar nele para me emocionar com as suas páginas carregadinhas de poesia e de memória. É um livro sobre todos nós, os sportinguistas, e para todos aqueles que, gostando do futebol, também consideram que “a distância da bola ao coração / é tão pequena como um grão de nada” (J. C. Francisco). Nele, a história do Sporting e dos nossos ídolos constituem a matriz referencial. Afinal de contas, o livro alimenta (e acrescenta) em cada um a vontade e o prazer de ler (e conhecer) sobre o clube de Stromp, Jorge Vieira, Peyroteo… e de Jesus Correia, Vítor Damas, Pedro Barbosa e tantos outros!
A propósito do livro e da sua memória mais antiga de leão, José do Carmo Francisco escreveu: “Realizei o meu sonho de criança quando na minha aldeia natal (Santa Catarina) ia atrás do carteiro para ler em primeira mão o jornal do Sporting logo que a D. Teresa ou o senhor Josué lhe cortassem a cinta de papel que o envolvia.” Imagino que foi então que no poeta se começou a construir a emoção das palavras quando se revelavam no sonho a magia de um pontapé de fora da área ou o malabarismo de um toque de calcanhar por atletas vestidos de verde e branco.
Desta belíssima obra, recordo o poema que foi dedicado a Pedro Barbosa, jogador cujo virtuosismo está na memória de quase todos de nós, ele que reinventava em cada jogada o gosto mais antigo pelo futebol enquanto forma de arte que sempre nos maravilhou e fez sonhar !
Pedro Barbosa (com o número 8)
Desenhas o teu jogo com um compasso
Com desprezo do esforço e do excesso
Onde não há, tu inventas novo espaço
Levando a bola até onde já não a meço
Tão veloz que não permanece na retina
E apenas surge no golo em conclusão
Afagas a bola numa ternura repentina
Como se de repente o pé tivesse mão
“Feito num oito” fica quem tu enganas
No drible mais inesperado e imprevisto
Em vez de dias tu permaneces semanas
Na memória de quem fez o seu registo
Tu não és o altivo artista mas o artesão
E se jogas sempre de cabeça levantada
É porque a distância da bola ao coração
É tão pequena como um grão de nada
Nas suas dez épocas no Sporting, Jesus Correia conquistou por sete vezes o Campenato Nacional - 1952/53, 1951/52, 1950/51, 1948/49, 1947/48, 1946/47 e 1943/44 - dois Campeonatos de Lisboa - 1946/47 e 1944/45 - e duas Taças de Portugal - 1947/48 e 1944/45. Estreou-se na Selecção Nacional em 1947, num jogo de carácter particular, a 5 de Janeiro. No campo das Salésias, Portugal empatou a duas bolas com golos de Rigério Pipi e Francisco Moreira. Jesus Correira rendeu Albano aos 75 minutos da partida. No total, representou Portugal por 13 ocasiões, tendo marcado três golos. Retirou-se em 1952, apenas com 31 anos. A dada altura, como jogava hóquei pelo Paço d'Arcos e futebol no Sporting, viu-se forçado a escolher entre os "dois amores" e optou pelo mais antigo: o hóquei.
Jesus Correia nasceu a 3 de Abril de 1924, em Paços de Arcos, tendo falecido a 30 de Novembro de 2003, com 79 anos de idade, quando era o último dos "Cinco Violinos". Foi apelidado de "Dois Amores", porque praticava hóquei em patins e futebol, ao ponto de ter sido internacional em ambas as modalidades. Ao longo da sua carreira - dez épocas - jogou por um único clube, o Sporting, marcando 130 golos em 157 jogos disputados no Campeonato Nacional. Abandonou o futebol na época de 1952/53, despedindo-se num jogo contra o Benfica, a 5 de Outubro de 1952, com uma vitória leonina por 3-2 e ele a marcar logo no primeiro minuto.
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