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Ser Sporting não se implora, não se ensina, não se espera, somente se vive... ou não.
“Big Mal”
O Sporting teve uma temporada desastrosa em 1980-81. Praticamente, o pior aconteceu em todas as provas em que participou. Para a época seguinte, o presidente João Rocha considerou que para o cargo de treinador teria de haver uma decisão inesperada e ousada. Tendo falhado a intenção de contratar José Maria Pedroto, seguiu uma sugestão de John Mortimore e foi buscar Malcolm Allison. O plantel era forte. A Manuel Fernandes, Jordão, Eurico, Carlos Xavier, Bastos, Inácio, Mário Jorge, Ademar e Nogueira, entre outros, acrescentou António Oliveira e Ferenc Mészáros.
“Big Mal” foi o mais heterodoxo de todos os treinadores do Sporting das últimas décadas, talvez mesmo incomparável em toda a história do Clube. Jogadores e adeptos contam inúmeras histórias a propósito dele, fascinantes, umas, e inverosímeis, outras. Com os seus métodos de treino, filosofia de jogo e cultura desportiva formou com Oliveira, Manuel Fernandes e Jordão um triângulo ofensivo inesquecível, um meio campo operário e uma defesa de betão. Houve sempre uma história de conflitos de egos entre as três estrelas da equipa, mas o Sporting conquistou o Campeonato e a Taça de Portugal.
Em Alvalade os jogos começavam vinte minutos antes da hora marcada quando Malcolm Allison ascendia ao nível do relvado junto da Bancada Superior Sul. O efeito era poderoso. Carlos Xavier contou mais tarde que “quando íamos a caminho do relvado já estávamos em pele de galinha, porque o Allison entrava em campo antes de nós e era um espectáculo dentro do próprio espectáculo. Dava a volta ao campo com o braço no ar a segurar o inconfundível chapéu. Os adeptos deliravam e nós também. Houve uma altura em que até havia música ao vivo e se tocava o Comanchero. O Estádio ia abaixo”.
Na pré-época de 1982-83, João Rocha cometeu talvez o maior erro da sua gestão ao despedir “Big Mal” durante o estágio na Bulgária. Uma história nunca esclarecida que terá gerado grande instabilidade e indisciplina na equipa de futebol. O presidente suspendeu o técnico, despedindo-o pouco depois, e António Oliveira foi nomeado jogador-treinador. Depois de ter conquistado a sua quinta “dobradinha”, o Sporting terá iniciado a fase que o conduziu à secundarização desportiva no futebol nacional.
Nogueira, um “carregador de piano”
Há jogadores de futebol que são grandes pela importância que assumem na sua equipa. Não serão necessariamente excepcionais, mas imaginamo-los sempre a ligar a equipa, a organizar e a comandar o jogo para a grande área adversária. Esses têm de jogar (quase) sempre. O bravíssimo António Nogueira foi uma figura incontornável do Sporting que conquistou o título de campeão nacional em 1981-82.
Nogueira chegou a Alvalade já com trinta anos de idade, onde esteve nas épocas de 1981-82 e 1982-83. Nessa altura possuía uma carreira longa de futebolista com passagens pelo Atlético (o seu primeiro clube), Braga, Boavista e Belenenses. Depois do Sporting ainda jogou no Recreio de Águeda.
No Sporting foi um “carregador de piano” de grande utilidade, fazendo o meio campo com Ademar e Virgílio. Sabendo que o ataque leonino era constituído por António Oliveira, Manuel Fernandes e Rui Jordão percebe-se melhor a importância de uma linha média assim batalhadora e operária.
A presença de Nogueira transmitia respeito. Com aquele bigode e cabeleira fazia lembrar o Rocha da série “Duarte e Companhia”. Mas, a ‘dobradinha’ (Campeonato Nacional e Taça de Portugal) dos leões na época de 1981-82 também se deve ao seu dinamismo inesgotável, à direita, ao centro, à esquerda, atrás ou à frente. Ele era o cimento que ligava aquilo tudo.
O treinador Malcolm Allison considerava-o essencial na estratégia do jogo da equipa e chegou a afirmar que havia dois génios no plantel leonino: António Oliveira e António Nogueira. Na realidade, no ano da ‘dobradinha’ Big Mal não prescindia dele pois esteve em vinte e quatro jogos para o Campeonato e em todos para a Taça de Portugal.
Nogueira era um verdadeiro jogador de equipa. Na fotografia uma equipa leonina da época de 1981-82:
Em cima - Eurico, Jordão, Meszaros, Virgílio, Inácio e Oliveira;
Em baixo - Lito, Carlos Xavier, Barão, Manuel Fernandes e Nogueira.
António Oliveira e o Sporting
O presidente João Rocha contratou os serviços de António Oliveira no Verão de 1981, quando ele exercia as funções de treinador-jogador no Penafiel. Chegou a Alvalade como jogador, juntando-se a Manuel Fernandes, Jordão, Eurico, Carlos Xavier, Meszaros, Bastos, Inácio e Mário Jorge, entre outros. Uma grande equipa. Permaneceu no Sporting durante quatro épocas.
Os sportinguistas recordam-se bem de Oliveira, até porque formou com Manuel Fernandes e Jordão um triângulo ofensivo inesquecível. Houve sempre uma história de conflitos de egos entre eles, mas o treinador Malcolm Allison tirou o capitão dessa equação, garantindo que “Manuel Fernandes era o mais envergonhado, altruísta”. Os problemas terão surgido depois da saída de 'Big Mal'.
No início da temporada de 1982-83, João Rocha entregou-lhe a orientação técnica da equipa na sequência de uma pré-época polémica na Bulgária com Malcolm Allison. Assim, Oliveira passou a treinador-jogador, conquistou a Supertaça e conduziu o Sporting até aos quartos-de-final da Taça dos Clubes Campeões Europeus, a melhor prestação do Clube nesta competição.
No dia 29 de Setembro de 1982 o Sporting recebeu o Dínamo de Zagreb, campeão da Jugoslávia, na primeira eliminatória da Taça dos Campeões Europeus. Na primeira mão os jugoslavos tinham vencido por 1-0. O jogo de Alvalade disputou-se num contexto de grande conflito emocional para Oliveira pois o seu pai tinha sido hospitalizado e estava entre a vida e a morte.
No entanto, ele quis jogar para “vingar aquele momento trágico”. Nas bancadas foi-se conhecendo a terrível situação do camisola dez. No relvado o jogador realizou uma exibição magistral culminada com três golos fabulosos. Ciro Blatzevic, o treinador do Zagreb, exclamou que “Oliveira é um fora-de-série”. Poucas horas depois, o jogador teve conhecimento da morte do pai.
A época de 1982-83 não correu bem aos leões. Se calhar, já estava escrito nas estrelas. Num derby na Luz que o Sporting perdeu por 3-0, Oliveira não compareceu alegando motivos de saúde. João Rocha percebeu o erro que tinha cometido e contratou Josef Venglos. Depois, muita coisa aconteceu no Sporting, mas desde aquele jogo com o Zagreb tenho uma dívida de gratidão para com António Oliveira!
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