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Ser Sporting não se implora, não se ensina, não se espera, somente se vive... ou não.
O Sporting está diferente. Mas, definitivamente diferente. Na verdade, os sportinguistas puseram termo à insanidade que quase varreu o Clube. Acabaram as voltas olímpicas, os murros no peito e a máxima “a primeira coisa a fazer é criar fama de maluco”. Acabou o tempo do “sebastianismo” com pinceladas “messiânicas”, sem qualquer outro limite que não fosse a glorificação pessoal. Era o tempo do “eu”.
Nesta época, até agora, o Sporting foi o campeão europeu de judo de clubes. Campeão europeu de crosse (corta mato) em atletismo feminino. Campeão europeu masculino e feminino de goalball. Campeão europeu de futsal. No momento da vitória, da aclamação dos vencedores, o protagonismo é de quem deve ser: atletas, treinadores e outras pessoas directamente ligadas ao triunfo. Cá dentro, a equipa principal de futebol conquistou a Taça da Liga e vai disputar a final da Taça de Portugal. Afinal, ainda pode ser melhor do que muitos imaginaram. É o tempo do “nós”.
Se fosse cínico, ou se tivesse o suficiente sentido de humor, diria que o Sporting está no pódio dos cartões amarelos e que um título de campeão ainda pode ser conquistado.
Mas, observo o quadro e espanto-me, afinal a equipa leonina é das mais indisciplinadas do campeonato da 1ª Liga portuguesa. Assim do género daquelas equipas que à maneira do treinador Petit jogam um futebol assaz pequeno, de meia bola e força para a frente e muita demora no jogo, ou forte e feio nas canelas dos adversários quando não existe engenho para mais.
O Sporting está em bonita companhia, lá isso é verdade, e do Porto, Benfica, Braga e Guimarães nem se avista o rasto. Ele há coisas…
O tempo é um bem escasso
Trata-se de uma fotografia com história dentro da História centenária leonina. Talvez uma história com sessenta anos, pelo menos desde Dezembro de 1961 quando o jornal Sporting (nº 568) publicou um extenso artigo de Couto e Santos, redactor do Mundo Desportivo, com o título “Um Sporting campeão faz falta ao futebol português”.
Os sportinguistas que assistiram aos festejos dos títulos de campeão nacional em 1962 e 1966 recordam-se bem da intensidade emocional com que foram vividos. Ainda estava presente a memória do período mítico dos “cinco violinos” e muitos ainda os tinham visto jogar.
Pela sua profundidade e extensão, o que era meramente conjuntural adquiriu um carácter estruturante. No seu período hegemónico, entre 1940 e 1954, o Sporting foi nove vezes campeão nacional. Depois disso, até à actualidade, conseguiu o mesmo número de títulos de campeão. Sabemos como se chegou até aqui, como o Clube deixou de ser ganhador e a crença e o entusiasmo dos adeptos foram substituídos pela frustração e pelo desespero. Até a Formação perdeu brilho e capacidade de produzir talentos.
Bruno Fernandes caído e cercado por adversários simboliza o tempo que se vive. Frederico Varandas apresentou os seus conhecimentos sobre o futebol como uma séria mais valia. O problema é que o tempo se tornou num bem escasso.
Memória e confiança
O clássico Sporting - FC Porto é um dos mais desejados pelos adeptos do futebol. Trata-se de uma rivalidade antiga que se iniciou em 4 de Junho de 1922 quando os dois clubes se defrontaram na 1ª mão da final do Campeonato de Portugal. Nessa altura constituía como que um confronto entre o sul e o norte de Portugal tal era a superioridade de cada uma das equipas na sua região.
Leões e portistas defrontaram-se por quatro vezes na final das cinco primeiras edições do Campeonato de Portugal, com duas vitórias para cada lado. O filme “O Leão da Estrela”, de Arthur Duarte, é bem revelador do imaginário dos portugueses na década de 1940.
Desde 1922 já se disputaram 230 desafios entre os dois clubes, com 82 vitórias do Sporting, 83 do FC Porto, 65 empates, 329 golos leoninos e 306 golos portistas. Para os leões, no clássico de hoje, a memória e a confiança caminham a par.
Aos jogadores sportinguistas exige-se que sejam verticais e inteiros perante a força do adversário e as peripécias do jogo. Que em todos os momentos sejam rigorosos e audazes. Que não vacilem. Que a nossa baliza seja uma fortaleza. Que os deuses os inspirem. Que uma centelha os conduza nos caminhos da grande área adversária. Que sejam magia e arte pura. Que nos fascinem e nos consolem. Que sejam mesmo leões.
Marcel Keizer, de 49 anos, é o novo treinador leonino. Desvinculou-se do Al-Jazira e terá assinado um contrato até 2020, mais dois anos de opção, com um salário anual de um milhão de euros, o limite salarial determinado pela direcção presidida por Frederico Varandas. Provavelmente será anunciado depois do jogo com o Arsenal. A sua contratação não se pode dissociar da vinda de João Pedro Araújo, actual responsável clínico do Al-Jazira e o director do departamento médico do Sporting a partir de Janeiro de 2019. Tiago Fernandes será um dos adjuntos.
O futuro do Sporting passa, portanto, por Marcel Keizer e por João Pedro Araújo. O técnico holandês terá a missão de reorganizar e coordenar todo o futebol do Clube, da formação ao profissional. Se possui ainda um escasso currículo como treinador, é reconhecido como profundo conhecedor da área da formação e competente na transição dos jogadores para os seniores. Será muito mais do que um mero treinador. O médico vai dirigir a Unidade de Performance considerada um instrumento fundamental do projecto de Varandas para a reabilitação do futebol leonino.
O perfil de Marcel Keizer levou-o ao comando da equipa B do Ajax (Jong Ajax) onde contribuiu para o aparecimento de nomes como André Onana, Matthijs de Ligt, Justin Kluivert, Frenkie de Jong e Donny van de Beek, entre outros. Em 2017 passou a orientar o plantel principal do clube de Amesterdão, porque segundo Edwin van der Saar, o director executivo, “conhece os jogadores, a organização e apoia a 100% a nossa filosofia. Além disso, demonstrou na última época [pela equipa B] um estilo de jogo claro e uma excelente performance”. Mas, o afastamento precoce das competições europeias (Nice para a Liga dos Campeões e Rosenborg para a Liga Europa) e a eliminação na Taça da Holanda frente ao Twente ditaram o seu despedimento em Dezembro, poucos meses depois de ter começado. Como sempre, os resultados ditam o tempo de permanência no cargo.
Quem conhece o técnico holandês refere que o seu ponto de referência é a escola de formação do Ajax e o seu modelo de jogo. Tal como Peter Bosz, a quem sucedeu em Amesterdão, é um discípulo de Johan Cruijff e as equipas que orienta têm por base o sistema táctico 4-3-3, ocasionalmente com três defesas. Gosta que os seus jogadores façam uma pressão alta e que dominem quando têm a posse de bola. Um futebol ofensivo que procura o domínio do jogo com bola, com muita mobilidade e dinâmica do meio campo para a frente, em que a organização defensiva parece ser o ponto mais problemático. As equipas dele marcam muitos golos, mas também sofrem bastantes. No entanto, Marcel Keizer define-se como um treinador que não se prende a uma determinada táctica: “prefiro antes colocar em prática aquilo que é melhor para a minha equipa”.
Desejamos as maiores felicidades a Marcel Keizer e à sua equipa técnica. O seu sucesso será o sucesso do Sporting.
José Peseiro é um pouco como a pescada. Antes de ser já era. Ainda mal tinha começado e já era um treinador a prazo. O presidente Frederico Varandas fez questão de sublinhar que quer o melhor treinador para o Sporting. Sousa Cintra também decidiu complicar-lhe a vida. Ouviu um coro de assobios em Alvalade quando o seu nome foi anunciado antes do jogo com o Boavista. Grande parte dos adeptos não o valoriza, e para muitos será sempre o responsável pelo “quase” em 2005. Apesar da bela vitória frente ao Boavista, ninguém se esquece da derrota com o Portimonense. Ele próprio dá a sensação de se sentir isolado.
Peseiro não tem margem de erro nem muita tolerância dos adeptos. Chega a ser revoltante certa hostilidade, mas não adianta invocar a realidade pois quase ninguém gosta dela como ela é. Poucos o ouvem quando tenta explicar o modelo de jogo mais pragmático e menos ofensivo porque ainda não tem jogadores com posse de bola que o permitam, e porque falta poder de fogo na grande área adversária. Também não interessa o facto de respeitar os adeptos leoninos, ao contrário de Jesus. Um treinador está sempre a prazo, mas o lugar de Peseiro está em risco quase desde o primeiro dia do regresso a Alvalade.
Os adversários de Varandas perceberam que neste momento o treinador é o ponto mais vulnerável da direcção do Clube. Não me refiro aos apaniguados do destituído que todos os dias procuram puxar para baixo o estado de coisas. Agora há quem aguarde na sombra. O mal da equipa leonina será o momento de acção, sempre foi assim, e quem está lá em cima sabe isso mesmo. A verdade é que Peseiro tem de fazer mais, a equipa tem de jogar melhor futebol e de vencer com maior frequência. Ele não pode revelar medo, tem de ser um líder ambicioso. Aquele discurso de perder por menos do que outros deita tudo a perder. É que há um lastro antigo que se lhe colou à pele e que volta sempre que há um desaire.
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